Mosaico: mitologia e fé cristã, as opções artísticas de um campeão olímpico octogenário

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Mito de Leda e o Cisne sobrevive em Manfroi
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Obra surpreende e revela talento do campeão olímpico

O mosaico do esportista ítalo-brasileiro Aldo Manfrói, 82 anos

Considerado por muitos pesquisadores e estudiosos como uma arte essencialmente romana, o mosaico é uma linguagem abraçada desde sempre pelos italianos, sendo que muitos deles a trouxeram para o Brasil como um legado da própria alma artística cultivada na Península ao longo dos últimos dois milênios.

Alguns desses imigrantes italianos fizeram obras notáveis, especialmente Antônio Alfredo Mucci, responsável por inúmeros painéis musivos em igrejas mineiras de norte a sul do Estado. Foi também autor do primeiro livro escrito e editado no Brasil sobre a arte, denominado Compêndio Histórico-técnico da Arte Musiva, publicado e distribuído em 1962 pela Editora Ao Livro Técnico.

Pois a arte do mosaico é também a principal linguagem artística empregada pelo ítalo-brasileiro Aldo Manfroi, um atleta olímpico octogenário, que residiu em Juiz de Fora por mais de 50 anos, tendo acumulado, desde que chegou ao Brasil, mais de 1500 vitórias esportivas. Veio a falecer em julho de 2007, surpreendendo a todos admiradores de sua trajetória desportiva e também de sua atividade artística.

Entre muitos títulos, foi detentor de 24 recordes sul-americanos, oito recordes brasileiros, um recorde mundial, e foi por dez vezes campeão brasileiro de triathlon, tendo sido considerado pela Federação Internacional de natação um dos dez melhores nadadores do mundo.

Aldo nasceu em 1925 em Ancona, na Itália, mas perdeu o pai muito cedo, vindo a ser criado pelo padrasto, que era alemão e o registrou como filho, conferindo-lhe duas nacionalidades. Aos cinco anos, já praticava natação e aos 15 anos, sagrou-se campeão no campeonato italiano juvenil. Durante a guerra, foi trabalhar no campo, prestando socorro aos feridos. Casou-se na Itália com uma filha de brasileiro, que lhe deu três filhos. Em 1953, convencido pela esposa, transferiu-se para o Brasil, fixando residência em Juiz de Fora, de onde nunca mais saiu.

Em 2006, aos 81 anos, Aldo recebeu a medalha do mérito legislativo da Câmara municipal de Juiz de Fora. Apesar da idade avançada, nunca parou de treinar corrida, natação e ciclismo, as principais modalidades esportivas nas quais sempre se destacou.

Suas obras em mosaico são exibidas eventualmente nas galerias de arte de Juiz de Fora, realizadas quase sempre com pastilhas vítreas. Um de seus trabalhos mais conhecidos é “Leda e o Cisne”, retratando uma passagem da mitologia grega, sobre uma jovem princesa de Esparta, que gostava de deitar-se na relva apreciando o canto dos pássaros, expondo seu corpo desnudo ao sol, sob os olhares dos deuses.

Um belo dia, ao vê-la, Zeus decidiu converter-se em cisne para poder cortejá-la. Movendo as plumas e o pescoço, o cisne atraiu Leda que se fascinou com as carícias proporcionadas pelo pescoço comprido e pelo alisar das asas, acabando por fazer amor com ele. Os meses se passaram e logo Leda padeceu de fortes dores, vindo a parir dois ovos, dos quais nasceram quatro filhos. Ocorre que Hera, irmã e esposa de Zeus, perseguiu Leda e a proibiu de viver no Reino. Em seu socorro, Zeus transformou Leda em uma estrela na constelação de Cisne.

O mito de Leda e o Cisne sobreviveu em suas expressões artísticas na Grécia antiga e chegou a Roma, onde ganhou novas cores, inclusive em tela pintada por Leonardo da Vinci, no início do século XVI.

Enfim, o mito é comovente e de forte carga erótica, sendo surpreendente que Aldo Manfroi tenha recorrido a ele para apresentar sua visão do episódio nas tesselas musivas, o que revela muito não só da força mítica da tradição helênica, como também a aguda percepção cultural do artista, cuja notoriedade advém mais de sua expressão esportiva do que propriamente artística.

S.Sebastiao em estilo clássico
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Obra no Edificio que leva o nome do santo, em J.Fora

                    Nos primeiros dias de 2008, tive oportunidade de passar um dia inteiro em Juiz de Fora, onde saí à procura das obras públicas de Aldo Manfroi, seguindo algumas indicações  fornecidas por sua viúva.
                      Em um prédio em frente à lateral da Igreja dedicada à São Sebastião, encontrei no edifício que leva o nome do santo, um painel em mosaico que vai do teto ao chão, mostrando o santo crivado de flechas, conforme o retrata a iconografia  tradicional da Igreja Católica.
Um pouco mais adiante, na Matriz de Juiz de Fora, fiquei sabendo que havia um outro painel de Aldo Manfroi retratando uma Santa Ceia. Não consegui vê-lo na ocasião porque a área do mural estava em obras, mas por extrema gentileza, uma assessora de imprensa da paróquia, Simone, enviou-me poucos dias depois algumas fotos notáveis da obra.
                    Trata-se de uma representação livre de Aldo Manfroi para a Santa Ceia. O projeto tem concepção figurativa, vendo-se no grupo de comensais algumas mulheres e outros personagens de complexa definição, fugindo bastante do estilo clássico da famosa última ceia, pintada por Da Vinci, em que Cristo reunira seus apóstolos para anunciar-lhes o desenlace que se avizinhava na sua trajetória terrena.  É, evidentemente, uma concepção ousada , que se encontra  no espaço destinado a festas e outros eventos de confraternização, o que demonstra um espírito aberto e tolerante dos sacerdotes diante da interpretação artística assinada por Aldo Manfroi. A meu ver, o artista pretendeu com sua visão pessoal mostrar que a Santa Ceia não envolveu apenas os apóstolos, mas toda a Humanidade em torno de Cristo e solidário com Ele.

Interpretação livre de Manfroi para a Santa Ceia
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Obra de Aldo Manfroi: questionamentos e liberdade de expressão