Basaia, a Vitória da vida
Home
O RETRATO DE DONA CARMELA SALGADO
A REDESCOBERTA DE CATELLI
Catelli é o cara
erro
Romero Brito no Rio
mosaicos de S. Bento do Sapucaí
A Bahia renovada: o mosaico de Eliezer Nobre
O mosaico do cineasta Mário Carneiro
Moema Branquinho, o profissionalismo na arte
A revolução silenciosa de Jo Kawamura
Schueler: uma vida dedicada ao mosaico
Mosaicos do Instituto Oswaldo Cruz
A comunidade luso brasileira no mosaico curitibano
Uberlândia revisitada pelos seus mosaicos
Flávio Phebo: cenários e mosaico
Ciranda do Mosaico, experiência de sucesso
Juarez Paraíso entre a dor e a Paixão
A homenagem a Lupicínio Rodrigues
Gustavo Nakler, o mosaico após o bronze
O mosaico cabeça de Maria Tomaselli
Isabel Ruas engrandece a arte
Um painel no Centro Cultural Franco Amapaense
Mosaico na revendedora Chevrolet
Romero Britto e Michael Jackson
Freud de Melo, pedra por pedra
Leonardo Posenato e a História
A arte coletiva do mural curitibano
Mosaicos variados de Alagoas
Obra de Raphael Samu tomba aos pés da UFES
No Recreio um santo mosaico
Clóvis Graciano: a longa espera
Mosaicos inspirados do Acre
No Metrô com Leilah Costa
Carlos Catini, de Tocantins para o mundo
A fauna pantaneira em mosaicos
Painel de Zenon Barreto, o resgate
Núbia Gonçalves colore a Paraiba
Vitória Basaia, a magia da vida
Mosaicos além da linha do Equador
Júlio Carvalho redesenha Porto Velho
O Clube Naval e seus pisos ilustres
O mosaico criativo de Fátima Campos
Regina Bustamante encara o leão
A tridimensionalidade em Marcelo de Melo
Bispo do Rosário, colecionismo no caos
Paulo Werneck, o maior de todos
Lorenz Heilmair entre os mosaicos e os vitrais
Sérgio Honorato: competência artística
Mosaicos de Belém no auge da borracha
Cláudia Sperb, a arte da cobra
A arara de Flávio Império
A arte pública de Zenon Barreto
Pisos em mosaico do MNBA
Estrigas e a revisão da História
Casa dos cacos de louça em Contagem
Roteiro do mosaico no Rio
Mosaico e turismo em São Paulo
O mural de Martinho de Haro
O mosaico de Noêmia Guerra
Mosaicos de Porto Alegre vieram do Vaticano
Os pisos do Palácio Tiradentes
Os mosaicos de Fritz Alt em Joinville
Aldemir Martins e o Dragão do Mar
A presença de mosaicos árabes no Brasil
A cúpula do Teatro Amazonas
A obra vasta de Heinz Schueler
O charme discreto de Raphael Samu
O mural de Odiléa Toscano
A religiosidade em Danúbio Gonçalves
O maranhense de Bacuritiba
De Newrton Navarro a Damasceno
Mosaicos de Chica Granchi, puro prazer
O mosaico do Cristo Redentor
OS MOSAICOS DE PORTINARI, REALIZADOS E A REALIZAR
A decodificação de Nitsche
EM CONGONHAS, UM MOSAICO AMOROSO
Mosaicos de Atitude em Clemência Pizzigatti
Murais em mosaico de Tomie Ohtake
BASSANO VACCARINI, DA ITÁLIA PARA O BRASIL
OBRA MURAL DE LEDA CATUNDA
Romero Britto e a crítica
Mosaicos do Palácio Guinle
Ianelli e a opção madura pelo mosaico
CLOVIS GRACIANO EM GOIÂNIA
Estevão da Conceição na favela de Paraisópolis
SAMSON FLEXOR: O CIRCO EM JAÇANÃ
A geometria do mosaico-calçada em Brasília
O muralismo musivo de Cláudio Tozzi
Mosaico de Lygia Clark no Rio
O chocolate de Vik Muniz e os cereais de Siron Franco
Mosaicos de Nazaré
Os mosaicos de Di Cavalcanti
Duas, três, muitas vezes CARYBÉ
Serafino Faro, mestre mosaicista
Os mosaicos apenas projetados por Carlos Scliar
Os mosaicos renovados de Luiz Ventura
Mosaicos de Roberto Burle Marx
HASSIS NA PRAÇA XV
Julio Guerra: reinvenção de Borba Gato
Galileu Emendabili e a Revolução Constitucionallista
A luz que atravessa a obra de Freda
Aldemir Martins, a última fase
O luxo cromático de Amélia Toledo
Percy Deane, um amazonense no Rio
AS INTERVENÇÕES DE SELARON NO RIO
presente papal: mosaicos do Vaticano
a presença e a ausência de Mucci
A pureza de Antônio Carelli
Carlos Oswald em Botafogo
O Buda do mosaicista Inimá de Paula
A Vila não quer abafar ninguém
Gastão Formenti, primeiro o artista, depois o cantor
Eduardo Sued, artista, prestidigitador
Mosaicos de Cozzo na Sinagoga
A obra de F. Gaudin no Rio de 1908
Mosaicos de Minas, religiosidade e arte social
Antonello L'Abbate, o ítalo-baiano
JOSÉ PARA SEMPRE MORAES
Carmela Gross: cabeça nas alturas, pés no chão
O mosaico do atleta Aldo Manfrói
Mauro Fuke, tesouro encontrado
A iniciação ao mosaico, de Athos Bulcão
Gershon Knispel no Sumaré
O imaginário de Copacabana
Mosaicos do Jockey carioca
A obra musiva de Gryner
Martha Poppe: do selo ao mosaico
Mosaico de Ladjane Bandeira
A obra perene de Franco Giglio
Bel Borba é a nova imagem da Bahia
A obra em mosaico de Leonilson
A arte sacra do italiano Angelo Tanzini
Cadê o Clovis Graciano que estava aqui?
Ignorância destrói obra de Paulo Werneck
Belmiro de Almeida: mosaico de 1934
Mosaicos em Serra Negra
Painéis de Glauco Rodrigues
Mosaicos de Poty Lazarotto
Os mosaicos que orgulham o Ceará
Mosaico de Paulo Werneck no Senado
Um poeta mosaicista, Rodrigo de Haro
O autor? alguém conhece?
Paulo Freire ganha monumento em mosaico
A obra de Portinari para Brasília
Mosaicos Armoriais de Suassuna
Alfredo Volpi na Casa de JK
Mosaicos de Lívio Abramo
Vista do Pão de Açúcar
O mosaico destruído em Belém
Manabu Mabe e o Ateliê Sarasá
A obra de Facchina no Brasil
Mosaicos verticais, vocação irresistível
Os mosaicistas ítalo-brasileiros
Impulso e compulsão na arte musiva
A nova Pampulha de Paulo Werneck
Painéis de JK
Calçadas de pedras portuguesas em Copacabana
Mosaicos da Imperatriz Teresa Cristina
Mosaicos romanos da Síria
Graciano, o modernista de Sampa
Um projeto de mosaico poético para Brasília

O mosaico vivo, Vitória Basaia

     A leitura dos textos críticos de Oscar D’Ambrosio tem sido um ponto de referência importante aqui neste espaço para o conhecimento da trajetória de alguns artistas de grande densidade plástica que costumam atuar distantes dos grandes centros de legitimação artística, mas que nem por isso deixam de apresentar uma produção de obras de grande densidade criativa, alheios às questões de mercado e conduzidos, antes de qualquer coisa, pelo impulso interior e pelo contato com as realidades dos ambientes isolados em que vivem.

vitoriabasaia511.jpg

Em D’Ambrosio é possível encontrar reflexões densas sobre artistas outsiders, muitos deles já falecidos, como o salineiro da Casa da Flor, em São Pedro da Aldeia, Joaquim Gabriel dos Santos, ou sobre o geógrafo Carlos Luis de Almeida, construtor da Casa dos Cacos de Louça, em Contagem, MG. O crítico é, seguramente, um farol de grande luminosidade nessa seara de identificação de talentos escondidos no interiorzão deste nosso país de dimensões continentais.

 

vitoriabasaia3.jpg

Não surpreende que D’Ambrosio tenha encontrado o que ele designou como “a casa dos guardados”, habitada pela jornalista e artista plástica Vitória Basaia, nos confins de Várzea Grande, próximo a Cuiabá, no Mato Grosso. Ali, ela reúne cabeças de bonecas dentro de garrafas plásticas, pinta conjuntos de cabeças, refaz as peças que encontra pela frente, costura e recostura bonecas de pano, dá-lhes nova cor e significado, opera transformações de sentido, algumas vezes com características sensuais e imprevistas. Sua arte parece estar sempre em mutação e boa parte delas resulta mesmo do processo de coleta de peças semelhantes para formação de uma terceira, com novo sentido e nova densidade plástica.

vitoriabasaia.jpg

O colecionismo como obra de arte já foi descrito aqui neste espaço no capítulo que trata da obra de Arthur Bispo do Rosário, no qual se viu que, além dele, outros nomes consagrados no mercado de arte também recorrem ou recorreram ao colecionismo para produzir novas leituras e novas realidades traduzidas pelo alinhamento dos objetos colecionados, como ocorreu, por exemplo, com Farnese de Andrade (na última fase), e também se apresenta em muitas obras de Nelson Leirner e Rosângela Rennó, entre muitos outros.

vitoriabasaia6.jpg

A arte de Vitória Basaia não é estranha ao colecionismo. Talvez seja um colecionismo mais exótico e que sofre intervenções mais densas por parte da artista, que parece ter ido residir tão longe para se articular melhor com as forças misteriosas da terra e com a magia interior com que reescreve seu próprio mundo e o sentido denso da vida. E da sua própria vida.

basaiapetit.jpg

Tudo nela é enigma e mágica, até mesmo essa trajetória inesperada em seu percurso de vida, iniciado como jornalista na grande cidade e vindo a se instalar no extremo oeste brasileiro em busca de uma relação direta com a terra e com a cultura da terra, perto das aldeias indígenas e da essência da existência humana mais primitiva. Para realização de suas peças vale-se de tudo que encontra ao seu redor, unindo e cruzando significados para obter novos olhares e novas possibilidades visuais.

arqueologiaurbanavitoriabasaia8.jpg

Dentro dessa perspectiva, pode-se observar que boa parte de sua produção artística decorre da atitude colecionista , seja de garrafas plásticas, seja de cabeças de bonecas, seja lá o que for e que esteja disponível para extrair da conjugação das peças a realização de sua obra.

O crítico Oscar D’Ambrosio conheceu sua casa e traçou um retrato profundo de admiração e respeito pelas soluções éticas e estéticas da artista, concluindo que “Vitória Basaia tem um compromiso de produzir sempre e de surpreender a si mesma e aos outros com suas soluções”

basaia.jpg

Enfim, fica claro que a arte e a vida de Basaia traduzem uma história de entrelaçamento caprichoso, moldada pela ousadia e pelo talento. Em seu estilo de trabalho há que se reconhecer a prática colecionista como um método e exercício de elaboração artística.

 

_vitoria_basaia_5.jpg

     Tal procedimento guarda certo paralelismo com a compulsão de outros artistas que constroem e reconstroem suas próprias casas indefinidamente, usufruindo o prazer buscado por todo artista, de morar dentro da própria obra, conforme observou Ferreira Gullar ao descrever a prática artística do salineiro Joaquim Gabriel dos Santos em São Pedro da Aldeia.

A obra de Vitória Basaia guarda, inegavelmente, um certo paralelismo com esses casos de compulsão artística e também com o colecionismo como prática de trabalho. Mas seria incômodo classificá-la como uma artista do mosaico, coisa que ela não faz. Seu método de trabalho e sua obra parecem indicar a existência de uma certa conexão com o inconsciente que lhe permite traduzir em peças artísticas suas angústias e visão do mundo, de forma densa e surpreendente. O mosaico, neste caso, é ela própria, um mosaico vivo, resultado da multiplicidade de suas conexões emocionais com o universo, com a magia do espaço e das peças que extrai de suas próprias entranhas para decodificação do mundo.

H.Gougon, julho 2010

Enter supporting content here