O mosaico no imaginário de Copacabana
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Mural de época, sem assinatura (uma pena)
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Fica em prédio residencial da Rua Serzedelo Correa

A arte do mosaico no imaginário dos habitantes de Copacabana

 

 

 

Embora esteja no cotidiano visual dos cidadãos de Copacabana, poucos são os que percebem o quanto a antiga arte do mosaico está presente na vida de sua gente desde a construção do calçadão ao longo da Avenida Atlântica, no início do século XX. Pois a mesma expressão plástica, em forma mais refinada, também ganha destaque nas paredes dos prédios que marcaram o processo acelerado de verticalização do bairro a partir da década de 40, coincidindo com a criação das primeiras fábricas de pastilhas cerâmicas e vítreas no Rio e em São Paulo.

 

As primeiras pedras para fazer calçamento no Brasil foram importadas de Portugal pelo prefeito Pereira Passos, que com elas pavimentou em 1905 os dois lados da Avenida Central (denominada Avenida Rio Branco a partir de 1912 como homenagem ao Barão do Rio Branco, falecido naquele ano). Além das pedras, o prefeito mandou trazer de Portugal os operários calceteiros para fazer o trabalho. Muitos deles permaneceram no Brasil onde constituíram famílias. As pedras vindas de Portugal eram calcita (branca) e basalto (negro), das quais o Brasil possui jazidas colossais, identificadas logo depois de sua importação, que nunca mais se repetiu. Mas a denominação “pedra portuguesa” ficou. Obviamente, em Portugal não a chamam assim. Em algumas regiões são conhecidas por “pedra pequena”, que traduz a expressão “petit pavé” dos franceses e que é também empregada, na forma estrangeira, pelos brasileiros da região sul, especialmente os catarinenses e gaúchos.

 

Na Avenida Atlântica, a primeira calçada da orla não apresentava a sensualidade das ondas que iriam tornar-se logotipo internacional do bairro a partir dos anos 40. Era apenas uma repetição de desenhos trazidos pelos mestres calceteiros, semelhantes a outros já existentes em Lisboa. É interessante estudar a diferença a partir de uma foto clássica da marcha dos 18 do Forte, ocorrida a 5 de julho de 1922, exibida aqui no site, registrando um momento emocionante da história brasileira. Ao lado dos tenentes rebelados, vê-se o traçado de curva pouco acentuada da calçada, única testemunha do massacre que as forças governistas perpetraram nas areias de Copacabana, datando o nascimento do movimento tenentista que iria marcar a vida político-militar do país por décadas.

 

As muitas ressacas que se seguiriam após os anos 20 exigiram reformas sucessivas no piso de calçada que logo ganhou curvas mais acentuadas, algumas vezes perpendiculares ao movimento das ondas, que pretendia imitar, outras reproduzindo-as paralelamente, como convém. O modelo foi mantido ao longo das últimas décadas, consagrando-se ao final dos anos 60  quando Roberto Burle Marx foi chamado a dar nova cara aos espaços pavimentares resultantes da duplicação da pista.

 

O paisagista preservou as curvas da orla, aguçando suas dimensões para que ganhassem ainda mais visibilidade e inovou no canteiro central e junto aos edifícios com a introdução de pedras vermelhas, com as quais tirou grandes efeitos plásticos, que sugerem inspiração nos traços artísticos dos desenhos das tribos indígenas brasileiras, especialmente os Kadiweu, exímios coloristas de objetos cerâmicos.

Outro mosaico em Copacabana sem assinatura...
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Quem souber o autor, por favor me comunique!!!

Nos prédios nascentes dos anos 40 e 50, as construtoras trataram de “vender” aos cariocas o gosto pela maneira de viver em apartamentos, uma característica própria do século XX.  Para valorizar os prédios, artistas modernistas foram convidados a realizar obras parietais nos pavimentos térreos capazes de emprestar um certo charme aos empreendimentos. Nomes como Athos Bulcão, Lygia Clark, Douglas Marques de Sá, e sobretudo Paulo Werneck surgem nesse novo espaço, oferecendo obras em pastilhas que sugerem uma arte vistosa, colorida, surpreendente e facilitada pelo surgimento de peças de revestimento que então cobrem os novos edifícios residenciais de Copacabana.

 

A arte parietal dos mosaicos, porém, não iria durar muito e já na década de 70, esta linguagem plástica saiu de moda e muitos prédios chegaram mesmo a retirar as obras construídas com pastilhas. Quem agiu dessa forma, perdeu. O mosaico voltou a ser procurado a partir dos anos 90 por artistas renomados como Glauco Rodrigues, Tomie Ohtake, Cláudio Tozzi, Amélia Toledo e muitos outros por todo o país. A revalorização da arte abre hoje um novo espaço até mesmo para a pedra portuguesa, que estava restrita às calçadas e que começa a verticalizar-se, subindo as paredes, como se observa nos postos de gasolina ao longo da Avenida Atlântica. É um novo espaço que se abre para a arte e para a vida, ganhando destaque e visibilidade em Copacabana, que ainda guarda painéis exemplares de uma época de ouro do mosaico, exigindo um trabalho de resgate e mapeamento dos exemplares remanescentes, modelados por artistas-artesãos conectados com uma arte milenária, capaz de emocionar, comover e revelar uma das principais expressões estéticas que moldou o nascimento do bairro.

 

Obra é da artista Noemia Guerra, uma preciosidade
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Infelizmente, a artista não assinou a obra (nem datou)

Dentre todas as obras parietais que decoram fachadas ou interiores de prédios em Copacabana, uma delas traduz uma singularidade que merece um estudo apropriado devido à construção cromática das tesselas que não encontra paralelo em nenhum outro logradouro público da cidade. Trata-se de um painel multicolorido, de difícil realização, executado na fachada de um prédio no Posto Seis, precisamente na Av. Raul Pompéia, 131, esquina com Júlio de Castilho. A obra é expressiva e revela grande domínio do uso de cores, mas infelizmente não está assinada.
O nome da artista é Noemia Guerra, segundo informação transmitida por uma das moradores do prédio, que vem a ser sua sobrinha. Nascida em 1920, Noemia teve uma vida inteira dedicada às artes, especialmente em Paris, onde viveu por longos anos, mas antes de mudar-se para a cidade-luz, percorreu um caminho artístico no Brasil, fazendo ilustrações para livros (um deles é o livro infantil "Tangará conta Histórias", redigido pelo escritor Olegário Mariano).  Nos anos 60, Noemia Guerra participou por duas vezes da Bienal de São Paulo, em 1963 e em 1967. Em seguida foi morar na França, onde participou de muitas exposições, algumas coletivas, outras individuais. Ainda hoje é possível encontrar seus quadros no acervo de galerias européias. Seus trabalhos guardam características figurativas que remetem às obras dos grandes pintores do movimento modernista brasileiro, mas possuem também um acento pessoal que cultivou e aprimorou em sua estadia no exterior. Noemia conseguiu notoriedade e fez parte de entidades francesas ligadas ao mundo das artes e da cultura. Infelizmente veio a falecer no início de 2007 pouco tempo depois de seu retorno ao Brasil, após décadas de intensa atividade artística na Europa. Como o painel de sua autoria é exuberante e fornece uma verdadeira aula de composição cromática em pastilhas vítreas, seria de grande valia que houvesse uma pequena placa no local informando a data da obra e o nome da autora em face do grande interesse que desperta. Afinal, o painel desperta emoções e enriquece o visual da área, mexendo com os sentidos estéticos dos moradores do bairro.

Infelizmente, muitas dessas obras remanescentes permanecem sem assinatura. Aqui e ali é sempre possível redescobrir um painel de Paulo Werneck, esse gigante do mosaico no século XX. Em boa parte de sua produção musiva, o artista deixou as letras PW inscritas no painel. Em alguns poucos esqueceu de assinar, mas seu estilo é sempre inconfundível.

 

Mas nem todos os murais guardam assinatura e fica difícil situá-los até  no contexto temporal em que se inscrevem. A verdade é que os painéis em mosaico estão ali para serem vistos e admirados. Alegram a vida e entram na alma dos habitantes de Copacabana, surgindo assim  por toda parte, sem pedir licença, como uma tatuagem esquecida que marcou a vida do bairro para sempre. E para sempre vale a pena ver de novo.

Obra assinada de Paulo Werneck na Dias da Rocha
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Paulo Werneck, o maior artista do mosaico no sec. XX

No cantinho, repare a assinatura do autor: PW
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PW, um autêntico Paulo Werneck!

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Em muitas páginas aqui deste site há abordagem sobre a importância de Roberto Burle Marx na construção do mosaico brasileiro. Em página específica enfoquei suas obras em pastilhas vitreas, sempre muito esquecidas pela crítica e pelos estudiosos de suas obras. Em outras páginas, há informações sobre sua vasta contribuição no mosaico-calçada, especialmente na orla de Copacabana. Nela, Burle Marx manteve o desenho original das curvas já existente desde o primeiro calçamento da Av. Atlântica, em 1906, pelos calceteiros portugueses. Apenas sensualizou as curvas até onde permitia a largura da calçada da orla. Na calçada central, que reparte as duas pistas, Burle Marx deixou fluir todo o potencial de sua criatividade, assim como na calçada junto aos prédios da Avenida. Vale apreciar. (Gougon, agosto 2009)

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