A hora e a vez de Heinz Schueler
Obra de Heinz Schueler para Igreja de Araraquara |
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Peça foi colocada no tímpano da Igreja Santa Cruz |
imagem está no tímpano da Igreja de Araraquara |
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Igreja dos missionários redentoristas |
Para quem chegou agora, é preciso informar que há um livro lançado em 1962 pela Editora
Ao Livro Técnico, de autoria de Antônio Alfredo Mucci, chamado Compêndio Histórico-técnico
da Arte musiva. A obra só é encontrada hoje nas prateleiras de boas bibliotecas e é um relato aprofundado da história
universal do mosaico. Ao situar a presença da arte em nosso país, o autor - um ítalo-brasileiro que se notabilizou pela realização
de muitos painéis no Rio de Janeiro e em Minas Gerais - salienta que já havia àquela altura no
Brasil artistas renomados envolvidos com a realização de mosaicos, citando três deles: Paulo Werneck, José Moraes e Heinz
Schueler.
A obra é assinada por Carybé e Heinz Schueler |
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Apure a vista para ler a inscrição "mosaico Schueler" |
Os dois primeiros já foram devidamente examinados e comentados em nossas páginas, mas
sobre Heinz Schueler nunca houve nenhuma outra referência em livros ou em páginas específicas da Internet.
Repare bem na assinatura: MOSAICOS SCHUELER |
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Schueler executou todas as obras em mosaico de Carybé |
De tanto procurar por ele e por suas obras nos últimos anos, acabei encontrando uma pequena
menção ao seu nome em uma página da Web que trata de assuntos paroquiais da pequena cidade de Monte Verde. Nele havia uma
referência ao artista e à sua filha, Renate, que passara a infância naquela comunidade. Consegui entrar em contato com o dono
do site e através dele localizei a filha de Heinz Schueler na cidade de Cleawater, na Florida, que muito ajudou na elucidação
de um enigma que há muito me intrigava.
Um universo de obras em mosaico
Ao estabelecer contato com Renate, descobri a existência de um vasto universo de mosaicos
realizados por Heinz Schueler. Ela ficou feliz pelo meu interesse no conjunto de trabalhos de seu pai e dispôs-se a prestar informações sobre a obra do artista, já falecido. Sua estimativa é de que ele
teria deixado no Brasil uma quantidade incalculável de peças.
Bem, diante dessa estimativa elevada sobre o número de mosaicos realizados por
Schueler, passei a refletir sobre onde estariam tantas obras se são quase inexistentes as informações a respeito de seu trabalho
artístico. Logo que Renate enviou-me as primeiras fotos das obras realizadas por seu pai pude entender a razão da ausência
de seu nome em livros ou revistas em nosso país.
Outra obra de Carybé executada por Heinz Schueler |
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Nome do realizador aparece ao pé da obra |
Veja a assinatura de Heinz Schueler no Painel |
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Carybé e Heinz Schueler realizaram este e muitos outros projetos |
É que Heinz Schueler sempre foi um exímio executor de obras em mosaico, mas quase não
se aventurou em criar seus próprios mosaicos. Infelizmente, num país como o Brasil, inexiste a prática de repartir a autoria
das obras de arte entre os que concebem e os que a executam. Certa vez, o Palácio do Planalto abrigou uma exposição de
esculturas de autores brasileiros e franceses no hall de entrada do prédio. Ficou muito evidente na ocasião que os escultores
franceses concediam o crédito às fundições de bronze que imortalizaram suas obras. Já os artistas brasileiros não o faziam.
O caso dos mosaicos não é diferente. Até hoje me pergunto qual ateliê ou quem realizou as
obras de Portinari em mosaico. Um verdadeiro mistério. Também ninguém sabe quem fez os painéis em mosaico
de Di Cavalcanti nem os de Clóvis Graciano e de tantos outros nomes famosos nas décadas de 50 e 60.
Foto do arquivo de Renate Schueler |
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A filha de Schueler guardou foto da época da realização |
Bem, a verdade é que quase nunca há menção aos verdadeiros executores das obras em
pastilhas. Quem estuda mosaico sabe muito bem que a empresa Vidrotil foi responsável por uma infinidade de
painéis e murais em nosso país, mas ela mesma não foi autorizada pelos artistas do passado a colocar o crédito pela execução.
De suas instalações surgiram muitos painéis e murais por este Brasil afora, mas são raros os casos em que aparece o nome da
empresa. Vale observar que a Vidrotil é também citada por Alfredo Mucci entre os nomes dos artistas que já podiam responder
por uma produção importante de obras em pastilhas à altura em que seu livro foi lançado (1962).
Uma parceria de sucesso: Schueler e Carybé
Heinz Schueler foi quem viabilizou a obra de dezenas de artistas brasileiros com a execução
de seus projetos para mosaico. Nem todos exibiram o nome dele nos painéis, mas é preciso chamar atenção para a exceção honrosa
de Carybé, de quem se tornou um grande amigo, tendo concretizado seus projetos para murais de Salvador e de São Paulo.
Um exemplo eloquente é o painel, ainda bem conservado, que se encontra no interior de
uma agência do Banco Itaú em São Paulo.
A obra de Carybé está assinada por ele junto com o crédito da execução a Heinz Schueler. Veja abaixo: o nome
do artista, o nome do executor e o ano da obra: 1961
Só isso já seria suficiente para legitimar a importância de Heinz Schueler no panorama
de obras em mosaico no Brasil. Mas não foi só.
Carybé realizou diversos outros painéis em mosaico na Bahia, alguns deles com sua assinatura
e também a do parceiro de execução. Uma das obras realizadas para um edifício residencial no bairro de Campo Grande, em Salvador,
também estampa ao pé do mural a referência a Schueler. Veja acima a obra de Carybé e repare na base do mosaico a inscrição
Mosaicos Schueler e a data da realização, 1957.
As três baianas de Schueler"
obra desenhada por Carybé e realizada por Schueler |
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A peça foi feita para demonstrar a habilidade de Schueler com a execução de mosaicos |
De sua filha Renate, recebi ainda uma obra singular realizada por seu pai sobre desenho efetuado por
Carybé. Esta obra está bem guardada por ela. Segundo sua informação, Heinz Schueler a executou apenas com o propósito
de mostrar a outros artistas sua maestria na execução de mosaicos. A peça tinha para ele um caráter "demonstrativo" ou seja, ele apresentava
aos artistas ou aos arquitetos que o procuravam como prova de sua capacidade para executar qualquer tipo de obra
em mosaico. Também com este mesmo propósito, o artista produziu um mosaico de característica bizantina retratando a cidade
de Nazaré no século XIII.
CIDADE DE NAZARÉ NO SÉCULO XIII |
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OBRA DEMONSTRATIVA FEITA POR HEINZ SCHUELER |
Espero estar contribuindo aqui para situar o nome de Heinz Schueler no nível adequado
de importância que merece pelo tanto que viabilizou na construção da arte brasileira.
Detalhe do mural na Agência do Itaú, em S. Paulo |
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Sua obra não se esgota na execução de painéis concebidos por outros artistas. Ele também
projetou e executou obras sacras para algumas cidades paulistas, entre as quais uma grande igreja em Araraquara,
a Igreja da Santa Cruz dos Missionários Redentoristas. Sua filha informou que ele evitava colocar assinatura
nessas obras porque achava que poderia macular a característica religiosa das peças, mas ela possui a foto da imagem realizada
pelo pai antes de sua colocação no tímpano superior do templo de Araraquara (veja acima, no início desta home page).
Quadro na casa da filha Renate Schueler |
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Quadro de baiana na casa de Renate Schueler |
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Além das peças que executou para outros artistas, Heinz Schueler deixou pequenos quadros de características
caseiras, apenas para ornar as paredes da sua casa. Estão todos na residência de sua filha, na Flórida. É interessante
salientar que essas peças têm forte influência das cenas da Bahia a seu tempo e dos desenhos de seu grande amigo Carybé.
Detalhe do painel de Schueler na Agência do Itaú |
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Quadro na casa da filha do artista |
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Enfim, fica claro que Heinz Schueler foi um artista responsável, operoso e de muito talento.
Aqui se esboça um começo do resgate de sua obra, mas com certeza ainda haverá muita coisa para revelar e escrever sobre sua
contribuição, até agora quase anônima, para o desenvolvimento das artes plásticas no Brasil.
HGgougon,
4 de novembro de 2009
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