Desde junho de 2005, uma obra de restauração orgulha Minas Gerais e o Brasil: é a obra de restauração da Igrejinha da
Pampulha, especialmente sua estrutura curva de sustentação de uma das peças musivas mais importantes do conjunto desenhado
por Niemeyer: o revestimento em pastilhas de autoria do artista Paulo Werneck, um dos maiores nomes do muralismo e da arte
do mosaico no século XX.
A restauração esteve a cargo da Fundação Roberto Marinho, que fez um trabalho importante em toda a área, depois de mais
de três anos de estudos sobre o patrimônio da Pampulha. Desde logo houve a percepção de que a perda de pastilhas na obra de
Paulo Werneck, realizada ainda nos anos 40, quando Juscelino Kubitschek era prefeito de Belo Horizonte, não decorreu de erro
do artista, mas de deficiência na estrutura curvilínea de revestimento da Igreja, para a qual eram necessárias juntas de dilatação,
somente providenciadas agora, cerca de 60 anos após sua construção.
A iniciativa da Fundação Roberto Marinho deve ser aplaudida, mas não podemos deixar de registrar a situação de abandono
em que a Igrejinha da Pampulha ficou relegada durante os últimos anos. Desde que constatei o problema deixei aqui registrado
os termos de minha indignação, juntamente com fotos demonstrando a situação deteriorada em que se encontrava a obra de Paulo
Werneck, prejudicada pelo erro estrutural na obra de Niemeyer, de quem, vale lembrar, era amigo fraterno e velho companheiro
de bancos de escola.
Devo também informar que para a recomposição das partes perdidas no revestimento musivo de Paulo Werneck, houve a colaboração
decisiva da sua neta, a professora Cláudia Santanna Werneck, que descobriu no interior do ateliê do avô uma quantidade significativa
de pastilhas cerâmicas que ele empregara na Pampulha nos anos 40. E Cláudia cedeu essas pastilhas para o restauro, sendo um
gesto da maior dignidade, sem o qual seria muito difícil à Fundação Roberto Marinho completar o trabalho empreendido na Igreja.
Segue abaixo o texto de minha indignação quando tomei
conhecimento do estado de penúria no revestimento da Igrejinha da Pampulha, em 2003. Felizmente, a situação mudou e a obra
de reforma deve servir de exemplo para outras que ainda demandam iniciativas deste gênero, de recuperação da memória nacional.
retrato do abandono: um modernista escanteado |
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Paulo Werneck, um artista musivo de forte expressão modernista |
A obra de Paulo Werneck na Pampulha: patrimônio abandonado
Quando minha filha ligou de Belo Horizonte, dizendo que comprou uma máquina
nova, digital, da Canon, não resisti: pedi-lhe que fizesse a grande gentileza de fotografar o revestimento da capelinha de
S. Francisco de Assis, na Pampulha, obra consagradora do grande mestre mosaicista dos anos 40 e 50, Paulo Werneck.
A arquitetura do prédio, todos conhecem, é de Oscar Niemeyer, e logo tornou-se
um cartão de visita que projetaria sua obra pelo Brasil afora. O prefeito Juscelino Kubitschek, que o convidara para realizar
o projeto, iria chamá-lo novamente alguns anos depois, já na condição de presidente da República, para construir os prédios
públicos de Brasília, ampliando o reconhecimento de sua arquitetura em todo o mundo.
O conjunto da Pampulha, que foi o traçado genial, esboço primordial da renovação
arquitetônica brasileira, depois de certo tempo, ficou no abandono. Há coisa de duas décadas passou por reformas e restaurações,
mas depois retornou ao esquecimento. Além da arquitetura admirável e do jardim singelo elaborado por Burle Marx, guarda em
seu interior belíssimos painéis em azulejos assinados por Cândido Portinari (cujo centenário de nascimento transcorre neste
ano). Grande parte dos ladrilhos que compõem o painel foram fabricados de novo, pelo grande artista ítalo-brasileiro Gianfranco
Cerri, hoje com 75 anos, ainda trabalhando. Esteve no início deste ano em Brasília, realizando obras de reparação nos portões
da Igreja Dom Bosco, na W-3 sul.
Mas pouca gente fala do revestimento musivo das paredes externas da
capelinha da Pampulha, que ganharam um traçado modernista, típico da época, assinado pelo painelista Paulo Werneck, um artista
consagrado que, a partir da década de 40, produziu e difundiu obras musivas
de grande apuro artístico por toda parte neste país.
Entre suas muitíssimas obras em mosaicos com pastilhas vítreas e pastilhas
cerâmicas, Paulo Werneck destacou-se na realização de um painel no Colégio municipal de Cataguases, que é um projeto que se
distingue na paisagem do Brasil modernista, tanto pelo traçado de Niemeyer, como por haver abrigado um painel de Portinari
("Tiradentes", transferido posteriormente para o Memorial da América Latina, em São Paulo).
Em meados do ano passado, o prefeito César Maia, do Rio de Janeiro, assinou
ato de tombamento municipal do prédio número 185 da Avenida Rio Branco, no centro da cidade, denominado "Edifício Marquês
de Herval". O prédio é também um marco do período modernista, e, entre as razões de seu tombamento, figura um painel musivo
de Paulo Werneck que ladeia a rampa de descida ao subterrâneo, onde fica a tradicional livraria Leonardo Da Vinci, especializada
em livros franceses. (Aliás, recomendo a livraria a todos os companheiros mosaicistas. É lá que encontro livros franceses
sobre mosaicos, sempre que vou ao Rio).
Não muito longe dali, próximo à Candelária, onde situava-se o antigo Banco
Boavista, também é possível encontrar outra obra portentosa do artista, nos mesmos tons azuis e pastéis claros que caracterizaram
sua obra nos anos 50.
Pois muito bem, quando recebi de minha filha as primeira fotos do revestimento
da Igreja da Pampulha, com o painel de Paulo Werneck, fui tomado por um sentimento de grande frustração e impotência ao verificar
a situação de penúria em que se encontra hoje a obra do artista.
Atingido por uma série de buracos, de natureza inexplicável, o painel também
foi vitimado por um atentado cometido pela própria paróquia, que abriu um rombo na parede, rompendo o revestimento, para colocar
um alto-falante, absolutamente desproposital e impróprio para a cobertura da igreja.
Uma lástima. Dá a impressão de que se trata de uma parte do Iraque atingida
pelos bombardeios norte-americanos!
É absolutamente inacreditável o que se passa na Pampulha, sem que se tenha
notícia da ação do Instituto do Patrimônio Histórico Nacional justamente em Belo Horizonte, berço do ex-ministro Gustavo Capanema
a quem se deve a idéia de criação do órgão e de Rodrigo de Mello Franco, que o instalou e dirigiu por trinta anos.
O que Deus uniu o homem não separa |
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Uma obra prima do modernismo exige reparos |
O padre abriu buraco para colocar alto-falante |
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PODE? |
Chama o Oscar! Chama o Oscar! |
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Se o Oscar Niemeyer visse a que ponto chegou sua obra... |
Obra de Paulo Werneck em Cataguases |
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Um marco do modernismo, ao lado de Niemeyer, Portinari e B. Marx |
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