Crianças brincam de ciranda em prédio do Rio. |
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José Moraes: elegância modernista nas pastilhas |
José Machado de Moraes nasceu em 1921 e dentre suas obras mais significativas encontram-se painéis em mosaicos
que concebeu e construiu em diversas localidades, mas sobre isso não há registros em livros nem em enciclopédias e nem mesmo
na Internet.
Consegui localizar e documentar em foto pelo menos dois desses painéis, graciosos e íntegros. Ambos exibem a geometria,
o jogo de cor e de sombra característicos do período modernista, um deles decorando prédio residencial no bairro do Flamengo,
no Rio de Janeiro, e outro figurando na entrada do chamado Uberlândia Clube, na progressiva cidade do triângulo mineiro.
Fragmento do mosaico em Uberlândia |
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Mosaico, documento vivo de uma época |
Não é a primeira vez que me deparo com a falta de menção a “obras em mosaico” sempre que encontro biografias
de artistas envolvidos de uma maneira ou de outra com a realização de painéis musivos. Os “biógrafos” e “estudiosos”
da arte do período modernista costumam empregar eufemismos para indicar o envolvimento do artista com o mosaico.
No caso de José Moraes, sempre que alguém ler em sua cronobriografia alguma referência do tipo “1950 - aperfeiçoa-se
em pintura mural na Itália”, desconfie. A leitura pode esconder que o artista também estaria aperfeiçoando-se em mosaicos
no mesmo período. Ou então quem ler que o artista trabalhou entre 1952 e 1958 com “decoração mural”, procure compreender
que o biógrafo quis dizer (ou não quis dizer) decoração em arte musiva, decoração em pastilhas ou decoração em mosaico.
Qual a razão dessa omissão voluntariosa? Está claro que é o preconceito que acompanha ainda hoje, por mera ignorância,
o discurso de críticos, biógrafos, professores de arte e curadores a respeito do mosaico e de sua forte presença no período
modernista. Como a arte “caiu de moda” a partir da segunda metade dos anos 60, essa gente prefere ignorar o envolvimento
dos artistas com a arte do mosaico por achar que isso diminuiria sua obra. Uma tolice a mais cultivada por falsos donos da
verdade.
Quem quiser, pode procurar: não vai encontrar qualquer menção a mosaicos na vasta obra de José Moraes. Trata-se de
uma lacuna imperdoável, que cuido de suprir aqui, esperando que outros companheiros interessados na arte venham agregar informações
sobre a identificação de mais obras do autor em mosaicos, certamente “perdidos” por este país afora. Tenho razões
para desconfiar que haja obras murais em mosaicos de sua autoria em algum bairro do Rio de Janeiro, até porque foi na cidade maravilhosa que ele nasceu e se criou. Posteriormente, viveu em muitas outras cidades, percorreu o Brasil
de norte a sul, e fez estudos e exposições no exterior, especialmente na Europa.
crianças brincam de cabra-cega em prédio do RJ |
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Cabra-cega: boa metáfora para os críticos da atualidade |
Foi professor da FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado, de S. Paulo) a partir de 1967 e nos anos 70 no Departamento
de Artes Plásticas da Universidade de Uberlândia. Como docente, seu currículo revela que ele foi o primeiro professor a iniciar
o consagrado artista Glênio Bianchetti nas artes plásticas em meados da década de 40.
José Moraes não brilhou apenas nas obras musivas. Interessou-se por todas as plataformas sem nunca ser atropelado
por qualquer tipo de vanguarda. Entre as inúmeras exposições que realizou por toda parte, consta uma individual de 1986 em
São Paulo tendo por tema “a arte contemporânea”.
Sua formação artística sempre foi da melhor extração. Quando ainda mal se entronizava a arte da gravura no Brasil
pelas mãos do grande artista Carlos Oswald, José Moraes o procurou por carta para conhecer algumas técnicas de água-forte,
acabando por manter farta correspondência com o mestre. Oswald revelou mais tarde que, à época, pensou em publicar um manual,
valendo-se da correspondência entre ambos. O livro não chegou a ser publicado, mas parte da troca de cartas entre Carlos Oswald
e José Moraes encontra-se fac-similada no livro Gravura em Metal, assinado por
Marco Buti e Anna Letycia, editado pela Edusp (Editora da Universidade de S. Paulo), com 300 páginas.
Um brinde à obra e à arte plural de José Moraes ! |
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Um artista genial sintonizado com o melhor de sua época |
José Moraes abraçou todas as técnicas e linguagens, sempre com muito talento e dedicação. No que tange à sua obra
em mosaico, é preciso destacar que foi ele quem arregaçou as mangas, juntamente com o artista Paulo Fonseca, para executar
o vasto mural que se espalha do teto ao chão no frontal de um prédio modernista em Juiz de Fora, o Edifício-Clube de Juiz
de Fora.
A concepção da obra é de Portinari, que foi buscar nos dois artistas
a competência técnica para a realização de dezenas de painéis semelhantes, mostrando a figura estilizada de um cavalo em mosaico
que se repete, cada peça com 96 cm por 163 cm,
ora cavalgando para um lado, ora para outro. José Moraes também foi o braço direito de Cândido Portinari na execução do mural
em azulejo que projetou para a Pampulha, um marco de virada na arte modernista.
Cavalos: desenho de Portinari, realização J.Moraes |
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Execução de José Moraes e Paulo Fonseca |
Obra cobre fachada do Edifício-Clube de J de Fora |
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J. Moraes foi parceiro artístico de Portinari também na Pampulha |
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Uma atualização em setembro de 2009:
Apostei e acertei quando disse aqui mesmo
neste espaço que era muito possível haver outros painéis em mosaico assinados pelo artista modernista José Moraes no
Rio Janeiro, além deste já bem conhecido da Rua Almirante Tamandaré, no Catete.
Pois há poucos dias, levado por algumas
indicações, procurei por toda Praça Baden Powell, no bairro do Leblon, até encontrar o painel, com que pude fotografar certa
tranquilidade porque a obra está exposta numa fachada debruçada para área pública.
Não creio que uma concepção da obra seja
de José Moraes, mas com toda certeza é dele a execução, que exibe duas lhamas se tocando, como se fizesse carinho uma
na outra.
José Moraes foi um grande artista plástico,
com talento para assumir qualquer encomenda. No caso dos mosaicos, a maioria dos trabalhos decorre de sua execução e concepção.
No caso desse desenho das lhamas no prédio da Praça Baden Powell,
Moraes aparentemente limitou-se à execução, deixando inclusive sua assinatura nas pastilhas, lendo-se: EXC: Moraes.
Ou seja, execução de José Moraes.
Além das obras já mostradas aqui neste site, há ainda um outro painel
concebido e executado por José Moraes há mais de 40 anos para as paredes de um restaurante em Uberlândia. O
Painel mostra um ambiente de fazenda e situa-se no interior do restaurante Sahtten. Algumas pastilhas soltaram-se da
obra, mas o propritário do estabelecimento já estaria providenciando reparos.
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