Hoje, dia 2 de fevereiro, aniversário da Bahia e dos cem anos de Heinz Schueler
O dia de hoje - dia dois de fevereiro (de 2011) -, é dedicado, na Bahia, à celebração de Iemanjá. Há muita emoção nas
festas que ocorrem por todo Estado, no litoral e no interior. Nesta data procede-se à lavagem das igrejas, com forte sentimento
devocional. A data é celebrada pelos baianos através de rituais religiosos e profanos em perfeita harmonia e sincretismo religioso.
Pois hoje, neste mesmo dia 2 de fevereiro de 2011, um dos maiores nomes da arte do mosaico no Brasil,
Heinz Schueler, se estivesse vivo, estaria celebrando cem anos de nascimento. Não era propriamente um baiano, mas um artista
nascido na Alemanha, que morou por longos anos na Bahia e contribuiu profundamente para dar expressão e grandeza à arte do
mosaico.
Heinz Schueler, se encantou com o Brasil e aqui viveu por longos anos
na cidade de Salvador, tendo produzido obras em mosaicos que se espalham hoje
por vários Estados brasileiros. Pode-se dizer que foi um “teuto-baiano” por seu envolvimento com a Bahia e com
os baianos.
Ao lado de nomes expressivos que popularizaram o mosaico nos anos 50, tais como Paulo Werneck, Alfredo Mucci e José
Moraes, o alemão Heinz Schueler colaborou profundamente para que o Brasil tivesse uma presença importante em obras de arte
na linguagem do mosaico.
Se alguém duvida de sua importância, basta verificar que todas as obras realizadas por Carybé, em mosaico, - e não
foram poucas – tiveram sua execução confiada a Heinz Schueler. Sua filha,
Renate Schueler, tem vasculhado os baús da família e encontrado uma infinidade de trabalhos artísticos realizados pelo pai.
Sou-lhe imensamente grato por seus gestos de carinho quando me envia pelos Correios ou pela Web mais informações sobre a obra
de Schueler. Ela reside nos EUA, mas circunstancialmente viaja à Alemanha.
Ainda há pouco recebi dela cópias em xérox de um artigo assinado por Heinz Schueler em 1959 na revista “ACROPOLE”,
que era uma publicação especializada em arquitetura e arte, considerada ainda hoje uma fonte importante para o estudo do período
modernista brasileiro, especialmente dos anos 50 e 60.
Para celebrar o centenário de nascimento de Heinz Schueler, publico aqui a transcrição que fiz do artigo de sua autoria,
publicado pela revista, bem como as fotos (em preto e branco) de algumas das muitas obras deixadas pelo fabuloso artista.
VEJA ABAIXO A FAC SIMILE DO ARTIGO ASSINADO POR HEINZ SCHUELER (DUAS PÁGINAS) E LOGO ABAIXO
A TRANSCRIÇÃO QUE FIZ DOS MESMOS, PARA VIABILIZAR A LEITURA.
TRANSCRIÇÃO
DA REVISTA:
Revista ACROPOLE,
número 249, julho de 1959)
ALGUNS ASPECTOS
DA ARTE DO MOSAICO
Heinz Schueler
A arte do mosaico é das mais antigas do mundo, remontando mesmo, ao que se
sabe, ao quarto milênio.
Os arquitetos de antes da Era Cristã, por certo não se sentiam satisfeitos
quando se defrontavam com as paredes lisas e cinzentas, resultando, daí, o início da utilização de pastilhas coloridas na
argamassa, a qual, depois de endurecida, foi chamada mosaico.
O primeiro mosaico, naturalmente, foi bem primitivo; contudo, com seu aperfeiçoamento,
tornou-se mais artístico, alcançando a representação figurativa. Os museus da Itália guardam ricos tesouros de mosaico antigo,
notadamente os de origem helênica. Quanto aos nomes, conhecem-se sòmente helênicos, com exceção de alguns bizantinos.
O início da troca de mercadoria possibilitou uma aproximação cultural dos
povos. Os califas que dominavam Córdoba, chegaram a pedir à corte bizantina alguns técnicos e materiais para o desenvolvimento
da arte do mosaico. No ano de 965, o califa de Córdoba, recebeu do Imperador Nikephrous Phokas um artista especializado em
mosaico, o qual conseguiu formar na Espanha vários discípulos. Originam-se, pois, dessa época , os mosaicos existentes na
cúpula da Mesquita de Córdoba. Por outro lado, artistas gregos especializados em mosaico, mudaram-se para a Itália, país onde encontraram boa acolhida e muita compreensão para sua arte, chegando mesmo a atingir
um alto nível.
Os primeiros cristãos criaram, nas úmidas catacumbas e nas primeiras igrejas,
figuras em mosaico de valor permanente. Em Roma, Ravena, Milão, Veneza e Nápoles nasceram nos séculos IV-VI e nos séculos
XI-XII em Bizâncio, as maravilhas do mosaico. A arte do mosaico alcançou, nessa
época, o seu ápice, como na Grécia antiga, em seu tempo, a escultura.
O artista de mosaico emprega o esboço do pintor, baseado na técnica do mosaico.
Com a prática dos anos, ele acaba conhecendo, exatamente, pelo esboço, como será a sua montagem da parede. Assim, a antiga
arte renasce para a arquitetura moderna e enobrece o aspecto geral da obra.
Fala-se em técnica de Ravenna, quando se trata de um quadro composto de “pedrinhas”
de mosaico do tamanho aproximadamente de 1x1 cm.
Para cabeças ou mãos usam-se, às vezes, pedrinhas de 1x2 mm. Considerando-se
que 1m 2(quadrado) de mosaico artístico comporta cerca de 10.000 pedrinhas e 1 m2 de cabeças e mãos cerca de 13.000 a 14.000, pode-se então, formar uma perfeita idéia do imenso trabalho
e do tempo necessário para a confecção de tal quadro. Em Ravenna, monarcas mundanos e clericais, nos primeiros séculos da
Era Cristã, construíam seus próprios túmulos, por cima destas igrejas e colocando
naqueles seus retratos ou então, cenas bíblicas. Esses trabalhos executados com uma técnica perfeita , simples e clara, com
efeitos de claro-escuro junto a tonalidades vivas, ainda hoje causam grande impressão aos que os contemplam.
O primeiro material originou-se do barro queimado colorido. Mais tarde empregou-se
o mármore, cortado e quebrado em cubos. Para imitar
as cores da natureza, queimavam-se e ferviam esses cubos, conseguindo assim, maior gama de cores. Ainda hoje são feitos os
mosaicos de revestimento do tempo, e de pisos por mármores coloridos. Mosaicos de parede, em mármore entremeado com pedras
naturais dão pelo seu caráter rústico, efeito bem agradável e suave para a vista. É inalterável sob a influência do tempo,
e fàcilmente se conserva limpo, como o mosaico de vidro.
Na Europa, sòmente nestes últimos tempos é que se fizeram escavações de túmulos
que datavam de mais de 2.000 anos. Removidas as camadas de terra e dos entulhos, apareceram com grande esplendor pisos de
mosaicos com motivos alegres, e seu colorido dava a impressão de terem sido feitos
recentemente.
Na Itália como no Brasil, o sol tem uma intensidade bem maior do que nos países
do Norte da Europa e mesmo na América do Norte. Um país com sol precisa de cores fortes; tal fato exigiu cores nas vestes
de seu povo, especialmente das mulheres.
Na arquitetura das Igrejas, dos palácios, das casas, o vidro colorido foi
chamado a desempenhar papel relevante. E com o desenvolvimento da indústria veneziana de vidros nasceu o mosaico de vidro,
feito de saibro, quartzo, areia e diversos metais óxidos, resultando, depois de queimados em fornos, os ortocromáticos, os
quais são comprimidos e submetidos a um processo lento de resfriamento. Para que fossem conseguidos ortocromáticos de tonalidades
delicadas, foram, às vezes adicionados na fundição metais preciosos, como cobre e mesmo o ouro. Inúmeras tonalidades nos dias
que correm são impossíveis de serem obtidas, visto não serem conhecidas mais as combinações e fórmulas das substâncias químicas. Em Roma, no Vaticano, existe um atelier de mosaico no qual a profissão de artista
do mosaico é hereditária e passa de pai para filho.
Este atelier tem uma riqueza de cores com aproximadamente 25.000 tonalidades
diferentes. Seus artistas se ocupam, em primeiro lugar, com a conservação constante de antigos mosaicos, como também, a arte
de copiá-los. Em Berlim, existe um atelier de mosaico que chega a produzir cerca
de 14.000 tonalidades diferentes e cerca de 3.000 em ouro e prata.
O Brasil, apesar de nação jovem, já vem realizando algo de apreciável no campo
do mosaico. Sendo um dos países cuja arquitetura é hoje considerada como de vanguarda, a aplicação dos mosaicos no revestimento
de fachadas , de interiores, de jardins, etc. vem encontrando um número de adeptos cada vez mais acentuado. Isto porque o
mosaico dá um efeito decorativo bem característico, seja pelo jogo de luz, de dia e de noite, como pela preservação que dá à parede ou superfície com o qual é coberto.
Não resta dúvida de que o mosaico produzido no Brasil se ressente de uma gama
de cores mais dilatada, o que impossibilita a execução de muitos trabalhos que resultariam mais ricos do que os atualmente
apresentados.
As fotos que ilustram este artigo, mostram alguns trabalhos do autor do mesmo.
AGORA, A FOTO COLORIDA DO
PEIXE É DE AUTORIA DE HEINZ SCHUELER EM PARCERIA COM O GRANDE ARTISTA CARYBÉ.
EM BREVE VAMOS EXAMINAR ESSA PRECIOSIDADE E OUTRAS MAIS DA GRANDE DUPLA HEINZ SCHUELLER E CARYBÉ.
Uma dessas fotos refere-se a um trabalho concebido pelo artista Flávio Phebo (cenarista consagrado e já
estudado em outro capítulo deste site) e foi executada por Heinz Schueler. Depois de concluida, a obra foi destinada à residência
da Sra. Maria da Estrella de Melo Bittencout, que na época residia à Rua Angatuba, 684, em São Paulo. Veja na foto abaixo.
Esta segunda foto (abaixo) é um painel em mosaico retratando peixes. Foi concebida e executada por
Heinz Schueler. Depois de finalizada a obra, o autor encaminhou a peça ao mesmo destino da obra anterior.
|